Para a nossa rubrica “Poema do Mês” escolhemos, agora em agosto, 2 poemas de algum modo relacionados com férias de verão. São poemas de incrível beleza que demonstram a magia das palavras e a sua capacidade de nos remeter a lugares, momentos e sensações.
“Viagem”, de Miguel Torga
Aparelhei o barco da ilusão
E reforcei a fé de marinheiro.
Era longe o meu sonho, e traiçoeiro
O mar…
(Só nos é concedida
Esta vida
Que temos;
E é nela que é preciso
Procurar
O velho paraíso
Que perdemos).
Prestes, larguei a vela
E disse adeus ao cais, à paz tolhida.
Desmedida,
A revolta imensidão
Transforma dia a dia a embarcação
Numa errante e alada sepultura…
Mas corto as ondas sem desanimar.
Em qualquer aventura,
O que importa é partir, não é chegar.
Algumas Notas sobre miguel torga
- Miguel Torga é o pseudónimo de Adolfo Correia da Rocha.
- Nasceu em S. Martinho de Anta em 1907, esteve emigrado no Brasil durante a Adolescência e cursou Medicina em Coimbra, onde passou a viver e onde veio a falecer em 1995.
- Destacou-se como poeta, contista e memorialista, tendo também escrito romances, peças de teatro e ensaios.
- Foi laureado com o Prémio Camões de 1989, o mais importante da língua portuguesa.
“AS FÉRIAS”, de Ary dos Santos
Era uma rosa azul de água amarrada
um palácio de cheiros um terraço
e uma jarra de amigos derramada
da casa até ao mar como um abraço.
Era a intensa e clara madrogada
com cigarras dormindo no regaço
e a ampulheta do sono defraudada
no tempo cada dia mais escasso.
Era um país de urses e lilases
de tardes sonolentas espreguiçando
um aroma de nardos pele chão
e bandos de meninas e rapazes
correndo amando rindo e adiando
a minha inexorável solidão
Algumas Notas sobre o Autor
- José Carlos Ary dos Santos nasceu em 1937, morreu em 1984 e foi um poeta e declamador português;
- Ficou na História da música portuguesa por ter escrito poemas de 4 canções vencedoras do Festival RTP da Cançãoe apuradas para representarem Portugal no Festival Eurovisão da Canção;
- É autor das obras Liturgia do Sangue(1963), Adereços, Endereços (1965), Insofrimento in Sofrimento (1969) e Fotos-grafias (1971);
- Escreveu também As Portas Que Abril Abriu(1975), que revela o seu entusiasmo com a revolução de 25 de Abril de 1974 e com a militância de esquerda.