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3 poemas de outono

No dia em que começou a primavera assinamo-la com 3 poemas. E agora que a primavera adormeceu e o verão se foi embora, lembramo-nos de 3 poemas de outono do poeta que mais amou as palavras e as transformou em arte: Fernando Pessoa.

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Porque privilegiamos palavras, elas nunca estão a mais e podemos oferece-las mesmo que não sejam nossas.

1. CANÇÃO DE OUTONO

No entardecer da terra,
O sopro do longo outono
Amareleceu o chão.
Um vago vento erra,
Como um sonho mau num sono,
Na lívida solidão.

Soergue as folhas, e pousa
As folhas volve e revolve
Esvai-se ainda outra vez.
Mas a folha não repousa
E o vento lívido volve
E expira na lividez.

Eu já não sou quem era;
O que eu sonhei, morri-o;
E mesmo o que hoje sou
Amanhã direi: quem dera
Volver a sê-lo! mais frio.
O vento vago voltou.

Fernando Pessoa

2. ESQUEÇO-ME DAS HORAS TRANSVIADAS…

Esqueço-me das horas transviadas
o Outono mora mágoas nos outeiros
E põe um roxo vago nos ribeiros…
Hóstia de assombro a alma, e toda estradas…

Aconteceu-me esta paisagem, fadas
De sepulcros a orgíaco… Trigueiros
Os céus da tua face, e os derradeiros
Tons do poente segredam nas arcadas…

No claustro seqüestrando a lucidez
Um espasmo apagado em ódio à ânsia
Põe dias de ilhas vistas do convés

No meu cansaço perdido entre os gelos
E a cor do outono é um funeral de apelos
Pela estrada da minha dissonância…

Fernando Pessoa, in “Cancioneiro”

3. Quando, Lídia, Vier o Nosso Outono

Quando, Lídia, vier o nosso Outono
Com o Inverno que há nele, reservemos
Um pensamento, não para a futura
Primavera, que é de outrem,
Nem para o Estio, de quem somos mortos,
Senão para o que fica do que passa —
O amarelo actual que as folhas vivem
E as torna diferentes.

Odes de Ricardo Reis –  Fernando Pessoa.

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